Como alimentaremos 10 bilhões de pessoas sem destruir o planeta? Será com carne feita em laboratório? E se fosse carne humana? O documentário ‘Coma um sueco’ (Eat a Swede) retrata um empreendedor em busca de financiamento. A ideia? Carne de laboratório, mas com um detalhe, as células multiplicadas são humanas.
Coma um sueco
‘Coma um sueco’ (você pode assistir na íntegra, é este vídeo acima!) é na verdade um “mockumentary”, ou seja, um pseudo-documentário. Os investidores e voluntários dos testes, porém, são reais e suas reações são genuínas, daí o realismo que a história transmite. A Federação Sueca de Alimentos, entidade por trás da produção do vídeo na verdade chama atenção para como alimentar uma população crescente de maneira sustentável. Eles também assumem publicamente uma série de compromissos ambientais para os próximos anos como se tornar uma indústria livre de combustíveis fósseis e cortar o desperdício de alimentos pela metade, e pedem a colaboração de todos para atingirem essas metas. A mensagem final é “não coma um sueco, coma como um sueco”.
Além da questão da sustentabilidade, tem muita coisa para ser discutida nesse pseudo-documentário. A própria federação afirma em seu site que, embora eles não pensem que carne humana cultivada em laboratório seja uma boa ideia, eles dão as boas-vindas a todos os tipos de inovações e novas tecnologias que possam aproximá-los do objetivo da produção sustentável de alimentos.
O aspecto cultural
Pensar em canibalismo é chocante. Não conheço nenhum tabu alimentar seja tão grande quanto esse, em todos os países e classes sociais a repulsa é a mesma. E olha que já fiz um post sobre produtos feitos com sangue (leia aqui)! É engraçado que no documentário são apresentados alguns argumentos bem conhecidos por todos como a questão do consentimento da doadora das células e do branding necessário para fazer a ideia decolar.
Ele fala sobre a composição “perfeita” de aminoácidos de que precisamos, que não é um ser humano em si, mas sim células de um doador e que comer um porco pode ser chocante, mas comer bacon não causa essa repulsa. Será que estamos cientes do que comemos hoje? E se sim, quantos comeriam em nome de uma parfeita saudabilidade ou para atingir o corpo “perfeito”?
Vale tudo pelo corpo “perfeito”?
Pensando ainda mais longe, num futuro distópico onde se prove que a composição perfeita da carne é a nossa, quantas pessoas estariam dispostas a comer esse produto? Vale tudo pelo corpo “perfeito”? A indústria pode produzir qualquer produto sustentável e investir milhões em propaganda que passaremos a comer sem questionar?
Quando descolamos a nutrição da alimentação todos perdemos, porque nós não comemos aminoácidos e carboidratos, nós comemos carne e arroz, não comemos nutrientes, comemos comida. A indústria de alimentos não precisa ser a vilã, quando bem feita, a produção de alimentos em escala industrial pode ser eficiente, sustentável e responsável.
E por falar em suecos…
Aliás, já que estamos falando dos Suecos, recentemente seus costumes foram alvo de discussão nas redes sociais quando uma postagem no Reddit perguntava “Qual foi a coisa mais estranha que você teve que fazer na casa de outra pessoa por causa da cultura/religião dela?”. Um usuário mencionou que teve de esperar na casa do amigo enquanto a família do amigo jantava. O relato foi parar no Twitter e provocou reações inflamadas nos internautas de diversas nacionalidades.
Enquanto em algumas culturas compartilhar comida e comer juntos é reforça a proximidade, houve quem defendesse que alimentar os filhos de outra pessoa pode envergonhar a família, pois a família tem comida em casa e o ato pode criar uma espécie de dívida de gratidão. Já na Arábia Saudita foi lançado um vídeo para que as pessoas parassem de insistir aos funcionários do censo para entrar e comer com eles. Alguns estudiosos argumentam que esta hospitalidade, às vezes até excessiva, está relacionada a memórias de privação do passado. “As sociedades geralmente se lembram da pobreza, escassez e abstinência por generosidade excessiva, presentes e hospitalidade como compensação”.
A gente não quer só comida
Esse é só mais um exemplo de que até mesmo os hábitos mais disseminados entre nós podem ser diferentes em outros locais e que ainda que a comida feita em laboratório um dia possa gerar qualquer alimento, não estamos livres do aspecto cultural. A cultura tem muito mais nuances do que a gente vê na superfície e isso impacta nos produtos que a gente desenvolve. Ter isso em mente é extremamente importante no desenvolvimento de novos produtos.
Referências: The Drum, NDTV, NPR, Insider